sábado, 30 de julho de 2011

Um pouco da História da Fisioterapia no Brasil

Muito interressante este post nesse blog.

A FISIOTERAPIA NO BRASIL: LINHAS GERAIS
“A história da fisioterapia mostra que a criação da profissão se deu principalmente em virtude da demanda que no contexto mundial se referia às grandes guerras e, no Brasil, aos acidentes de trabalho e epidemias, como a poliomielite. Antes de fundamentar bases sólidas como área de conhecimento, esteve sob a coordenação de departamentos médicos, tanto em serviços público/privados quanto em universidades. Sempre ligada à medicina, com características de subárea, seu corpo de conhecimentos acabou por acompanhar, de forma dependente e estreita, as mesmas áreas de estudo e campos de atuação profissional (REBELATTO; BOTOMÉ, 1999).

Perceber as concepções teóricas que nortearam o saber fisioterapêutico como uma cultura específica, porém em interação com outras realidades, pode encaminhar para uma reflexão mais crítica. Apesar de a fisioterapia e de a medicina serem áreas de conhecimento diferentes, ambas se apóiam e são baseadas em um paradigma mecanicista, no qual a perspectiva unicausal, não obstante ser percebida como insuficiente, não possibilitou a incorporação do contexto social como fundamental para a análise dos fenômenos de doença e saúde.

Essa condição definiu para a fisioterapia as formas de assistência que poderia oferecer, ou seja:

[...] as formas de assistência às condições de saúde novamente ficaram reduzidas ao atendimento de uma população já lesada, já acometida de males que necessitavam ser “controlados”, não no sentindo de “não ocorrência”, mas de “mantê-los em níveis” que não perturbassem o sistema social. Partindo do pressuposto de não perturbação do sistema social vigente e predominante, o desenvolvimento das profissões no campo da Saúde, por muitas vezes, parece ter sido orientado a trilhar caminhos sem mesmo levar em conta os conhecimentos científicos já produzidos e disponíveis (REBELATTO; BOTOMÉ, 1999, p. 46).

A re-inserção social dependia muito mais de uma habilidade adaptativa do paciente do que a realidade de suas redes sociais ou do seu itinerário terapêutico. A saúde como um todo se restringia somente ao ato curativo, abandonando de uma forma incisiva a iniciativa de uma possibilidade de medicina social, na qual a relação saúde–doença e as condições econômico-sociais deveriam ser submetidas à investigação científica (KOIFMAN, 2001).

A perspectiva de uma medicina social remonta ao século XIX, onde na França e na Alemanha já se concebia a medicina como uma ciência social. Contudo, em oposição a essa perspectiva, Bering, médico alemão, pontuou que tais concepções mereciam restrições, porque, de acordo com a teoria das doenças infecciosas de Pasteur, o médico poderia trabalhar na sua “especificidade sem a necessidade de um desvio para considerações e reflexões sociais” (ROSEN, 1980,
apud KOIFMAN, 2001, p. 55).

Várias teorias sobre a doença surgiram posteriormente, e uma negava a outra; o que as unia era somente a negação da medicina como ciência da sociedade, pois

a medicina como ciência social implicava compromisso e redirecionamento econômico do Estado; as novas concepções, por sua vez, além de desonerar o Estado, responsabilizando o indivíduo por suas doenças, necessitavam do desenvolvimento de equipamentos e medicamentos muito mais compatíveis com a lógica capitalista de desenvolvimento
(KOIFMAN, 2001, p. 56).

De acordo com tal lógica, em 1910, nos Estados Unidos, foi realizado um estudo sobre a educação médica, liderado pelo médico Abraham Flexner. Tinha como objetivo geral dar ao ensino médico e à medicina uma base científica sólida. Para isso, buscava contemplar um grande número de temas, que variavam desde os aspectos mais específicos da educação, passando pela questão da participação feminina no trabalho médico, até a discussão sobre a inclusão de minorias na assistência médica (LAMPERT, 2002; KOIFMAN, 2001).

A enorme força que teve esse relatório fez com que ele, além de disciplinar o aparato formador dentro dos Estados Unidos, incluindo a redução do número de instituições de ensino existente na época, influenciasse não apenas a formação, mas também a prática médica, tanto naquele país com em todo o mundo.Embora tenha reformulado e modernizado o ensino médico, nele foram descritas características mecanicistas, biologicistas, individualizantes e de especialização da medicina, com ênfase na medicina curativa e exclusão das práticas alternativas. Consolidou-se, então, o paradigma da medicina científica que orientou o desenvolvimento das ciências médicas, do ensino e das práticas profissionais em toda a área da saúde ao longo do século XX.

Assim, as características ainda hoje tão marcantes da educação superior nessa área, quais sejam a segmentação em ciclos básico e profissional, o ensino baseado em disciplinas ou especialidades e ambientado predominantemente no hospital, têm origens no relatório Flexner, que assume, segundo Lampert (2002), as seguintes características:

1. Predominância de aulas teóricas, expositivas/demonstrativas, nas quais o processo de ensino–aprendizagem está centrado no professor;
2. Prática desenvolvida predominantemente no hospital;3. Capacitação docente centrada unicamente na competência técnico-científica;4. Mercado de trabalho referido apenas pelo tradicional consultório, no qual o médico domina os instrumentos diagnósticos e os encaminhamentos e cobra seus honorários sem intervenções de terceiros.
A prática empírica, já suprimida, é praticamente diluída em especializações e subespecializações e dá lugar à prática indissociável da investigação científica. A profissão médica, pelo avanço técnico alcançado, diferenciou-se pelo processo contínuo de obtenção de informação, reforçou a idéia de poder, constantemente, definir e redefinir os limites entre o normal e o anormal fisiológico. Conseqüentemente, para garantir esse domínio, desenvolveu-se a necessidade de divisão técnica do trabalho no interior do corpo profissional (LAMPERT, 2002).

No Brasil, segundo Rebelatto e Botomé (1999), o primeiro serviço de fisioterapia propriamente dito foi instalado em 1929, dentro do Hospital Central da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, pelo médico Waldo Rolim de Morares, que, posteriormente, também organizou o Serviço de Fisioterapia do Hospital das Clínicas de São Paulo, iniciando o primeiro curso para a formação de técnicos em fisioterapia em 1951 até 1956, o qual possuía a duração de 2 anos.

O primeiro Parecer Oficial (n.º 388/63) sobre a profissão no Brasil apresentou limitações em relação à construção de uma identidade com bases sólidas. O que atrasou a definição do objeto de trabalho e as discussões sobre a busca de autonomia profissional. O texto do Parecer (BRASIL, 1963) é significativo:

A referida Comissão insiste na caracterização desses profissionais como
auxiliares médicos que desempenham tarefas de caráter terapêutico sob a orientação e responsabilidade do médico. A este cabe dirigir, chefiar e liderar a equipe de reabilitação, dentro da qual são elementos básicos: o médico, o assistente social, o psicólogo, o fisioterapeuta e o terapeuta ocupacional. [grifo nosso]

[...]
Não compete aos dois últimos o diagnóstico da doença ou da deficiência a ser corrigido. Cabe-lhe executar, com perfeição, aquelas técnicas, aprendizagens e exercícios recomendados pelo médico, que conduzem à cura ou à recuperação dos parcialmente inválidos para a vida social. Daí haver a Comissão preferido que os novos profissionais paramédicos se chamassem Técnicos em Fisioterapia e Terapia Ocupacional, para marcar-lhes bem a competência e atribuições. [grifo nosso]

Segundo uma visão mais atual, percebe-se que o problema não foi solucionado completamente. Um estudo realizado por Rebelatto e Botomé (1999) sobre a grade curricular de 15 universidades de fisioterapia no Brasil acabou po revelar as seguintes perspectivas profissionais. Observa-se que não existe uma homogeneidade das disciplinas e que os objetivos apresentados não definem claramente o que o aluno deverá absorver como essencial no exercício da profissão. Há uma ausência de graus ideais de unificação
[interação] das matérias, o que remete a uma identidade profissional influenciada por campos profissionais já existentes e mais ‘consolidados’ e decorrentes de definições estabelecidas em outras realidades sociais.

Até 1969, ano de regulamentação da profissão, existiam seis escolas de reabilitação para a formação de fisioterapeutas no país. Nos 12 anos seguintes, entre 1969 a 1981, foram registrados aproximadamente 14 novos cursos de fisioterapia. Em 1984 subiu para 22 escolas, em 1998 para 115, em 2002 estava em torno de 141 cursos (SCHMIDT, 2002).

Em 1975, por intermédio da Lei 6.316, foram criados os Conselhos Federal (COFFITO) e Regionais (CREFITOS) de Fisioterapia e Terapia Ocupacional. Em decorrência do número insuficiente de fisioterapeutas na época da criação dos conselhos, e considerando os vínculos anteriores mantidos, a união com os terapeutas ocupacionais foi necessária para que a criação dos Conselhos fosse aprovada. Assim, a profissão se fortalecia por meio de um órgão de classe que assumia a função de legislar, estabelecendo o Código de Ética Profissional, normatizando a profissão e a atuação do fisioterapeuta (SCHMIDT, 2002).”


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Fonte:
ALBERTO SUMIYA: “O CORPO NA HISTÓRIA E O PARADIGMA BIOMÉDICO NA MUDANÇA CURRICULAR DA FISIOTERAPIA”. (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Estadual de Londrina, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Ciências Sociais. Orientadora: Profª. Drª. Leila Sollberger Jeolás). Universidade Estadual de Londrina – UEL. Londrina, 2007


Retirado na íntegra do blog: humordarwinista.blogspot.com
Iba Mendes

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